terça-feira, novembro 30, 2010

E ai, cara pálida? Ou 'E agora José?'





E ai, cara pálida? Ou 'E agora José?'


Quando vi, pela primeira vez, um menino encolhido deitado sobre uma tampa daquelas que existem nas calçadas, no meio da tarde, as pessoas desviando, senti dor profunda. Fazia frio, ele se aquecia no ar morno que subia da tubulação subterrânea.
Continuei meu caminho. Era um menino viciado em cola, eu já os vira por ali muitas vezes, em frente às lojas de luxo de Ipanema.
Conversei com amigos, fizemos um projeto social com um nome bonito IPPE (Institudo de Psicologia Preventiva e Ensino). Registramos, tínhamos livro Ata, estas coisas. Ai, um dos amigos teve um derrame, o outro ficou sem tempo e eu sozinha não dei conta, naquele momento fui levada para longe por um tsunami pessoal.
O projeto está aqui em alguma gaveta, penso nele sempre, pretendíamos atender em grupos em clínicas sociais de bairros. Cada bairro uma clínica, teríamos uma clínica piloto inicialmente. Seria um espaço para as pessoas serem ouvidas, pretendíamos um trabalho preventivo.
A onda gigante me trouxe para o nordeste. Aqui tenho tentado encontrar espaço para um trabalho social, há muito o que se fazer, mas pouco espaço. Há que se cavar a terra e eu não encontrei ainda as ferramentas adequadas. Isto leva tempo, espero não desistir, não há mais tempo a perder, o tempo urge.

segunda-feira, novembro 29, 2010

Um jovem que faz a diferença- Morro do Alemão- Rio de Janeiro


Parabéns, Rene Silva e cia. Estou torcendo por vocês.

Aqui: Notícias de uma guerra particular


Rene Silva, jovem do morador do Morro do Adeus, twittou em tempo real a invasão da polícia ao Complexo do Alemão. 


                                                        

" Estudante e morador do
Morro do Adeus, no Complexo
do Alemão, Rene é repórter,
fotógrafo, redator, editor e colunista
do Voz da comunidade,
jornal que criou há cinco anos
para denunciar os problemas
da sua região. O sucesso do
periódico fez com que ele conseguisse
o patrocínio de uma
operadora de celular, que lhe
deu um iPhone, aparelho que
também usa para twittar e fazer
fotos e vídeos."

terça-feira, novembro 09, 2010

Contardo Calligaris no Roda Viva



Vejam aqui a entrevista, apesar da tendência política de alguns jornalistas, Contardo conseguiu sair-se muito bem falando- ele é ótimo quando se expressa. Vejam e digam.

quinta-feira, novembro 04, 2010

Mais do que tecnologia é o que você faz com ela.




YouTube - Mais do que tecnologia é o que você faz com ela.

O dia em que caiu o véu e o preconceito




Muito triste isto. Vivi no sul, depois sudeste e nunca havia visto uma reação hostil tão intensa.

Vivo no nordeste, admiro o nordestino pela força, pelo trabalho. Não é um povo, como pensam muitos, que vive na rede, ou de esmola- é um povo que trabalha sob um sol de deserto, sem água, sem sombra, sem refresco.

Observo isto desde que cheguei- usam camisas de mangas compridas- um dia perguntei a um pedreiro o porquê: Para não pegar tanto sol.

Imaginem, sol a pino, 40°, e você trabalhando das sete às cinco da tarde, com 20' para almoçar.

Me referi aqui aos trabalhadores de obras, que são os que eu pude ver de perto enquanto faziam minha casa e as outras do condomínio. Eles continuam aqui ao lado construindo outro condomínio para a classe média alta viver.
São simples, não têm inveja, agradecem o que têm. Dizem naquele sol escaldante quando passo por um e digo:

- Que sol, hein?

- É, mas graças a Deus temos emprego.

Nordestino não vive de esmola, trabalha se tem emprego, trabalha duro. Vejo os vizinhos, saem cedo, mal os vejo, voltam tarde- muitos à noite, estudam.

Lamento que uma elite arrogante pense ser melhor do que este povo daqui. Prefiro mil vezes uma pessoa simples do que o esnobismo do frequentador de um shopping center.

Evito citar os lugares dos ataques contra nós- também me incluo, afinal escolhi viver aqui-porque sei que não vem de um setor apenas, de uma região- aqui mesmo em Natal ouvi uma pessoa dizer que Dilma iria ganhar porque a esmola do Lula  funcionou.

Não sou especiaista no assunto, mas sei que alguns ganham, sim, uma cesta básica- ou bolsa família- para que os filhos não morram de fome. Há muita pobreza ainda, sim- há mulheres sozinhas, muitas, criando vários filhos sem recursos nenhum- sem instrução, sem apoio, sem saúde- estas são beneficiadas com o Bolsa família. Estas são beneficiadas com o leite para os filhos. Algumas se drogam, vendem o que recebem em cesta básica- esta é uma realidade que eu sei que está muito próxima de mim- ali onde minha faxineira mora.

Como condenar à morte esta geração de mulheres e crianças? Como fingir que não existem?
Por isso votei em Dilma.

O mínimo que um Governo precisa fazer por um povo é não deixá-lo morrer de fome. Lula não deixou e ofereceu emprego, abriu frentes de trabalho- eu vejo aqui o número enorme de obras da construção civil. Ai, dizem, a classe média se ferra. Não, esta classe se beneficia com as facilidades de um financiamento para comprar uma casa própria- é o que acontece por aqui. Ai, não?

Eu nunca fui lulista nem dilmista, mas no momento em que vi Dilma ser atacada assumi o meu papel de mulher na campanha- não poderia permanecer impassível diante de tantos ataques a uma pessoa que lutou por democracia enquanto eu me fechava por medo.

Obrigada Lula, obrigada Dilma!

Sorte e vida longe para os dois.

E quanto a este povinho reacionário, insensível, cego à pobreza que ainda persiste, o nosso desprezo.

Não pensem que por viveram em cidades com mais recursos, mais ricas, isso faz de vocês pessoas melhores- pelo contrário- estão  mostrando o que há de pior nos Homens- o preconceito, o racismo, o ódio, quando todos somos irmãos.

Alguém duvida?

O Brasil nasceu aqui. Ou não sabem história do Brasil?

Minha família tem origem na Paraíba, lembrei agora.

Vídeo daqui:

Mayara Petruso quer afogar nordestinos. Ela não é a única | Blog do Rovai

Contardo Calligaris: Qual divisão do país?





O país me parece muito mais maduro do que mostraram os grupos raivosos das militâncias




SEGUNDA-FEIRA CHUVOSA, no Rio. Leio todos os jornais que encontro, tomando meu café da manhã na Pavelka, padaria merecidamente popular, no Leblon. Não sou o único cliente com mais de um cotidiano nas mãos.

Na mesa do meu lado, dois homens, mais ou menos da minha idade, comentam o resultado da eleição presidencial. Aparentemente, um dos dois votou no Serra, e o outro, na Dilma; mas é óbvio que nenhum dos dois é um fanático.

O tom geral da conversa é de uma certa preguiça, um "ainda bem que terminou", alimentado pela sensação (que os dois parecem compartilhar) de que não havia nada de realmente decisivo que opusesse os candidatos do segundo turno.

Enquanto escuto os dois amigos do Leblon, que comem croquetes de frango e carne, como eu, penso que o país não está dividido e não tem por que estar.

Para começar, contrariamente ao que foi repetido nas queixas de ambas as partes, a campanha não foi especialmente violenta nem sórdida. Tudo bem, voaram balões de água e rolos de fita crepe, e os militantes se chocaram aos berros, de vez em quando. Como é normal que aconteça, cada lado acusou o outro de baixaria e brutalidade. E cada lado zombou das "lamúrias" do outro. Por sorte (mas, na verdade, penso que não foi sorte: foi juízo), os (raros) enfrentamentos nunca tiveram consequências graves, e eu me lembro de uma época, na Europa, em que uma manifestação sem feridos era exceção.

Cá entre nós, a campanha de 2010 foi tranquila. E não acho que isso tenha acontecido só graças ao temperamento naturalmente conciliatório dos brasileiros.

Ainda no primeiro turno, li as propostas e os argumentos de Dilma, Serra e Marina. Pois bem, nunca fiquei com a impressão de que o país estivesse, como se dizia nos meus tempos, diante de uma "escolha de sociedade", tendo que decidir entre futuros radicalmente divergentes. Ao contrário, parece-me que o país teve a sorte de ser chamado a votar em candidatos que todos, atrás das oposições indispensáveis para que as candidaturas e as campanhas fizessem sentido, compartilhavam as mesmas preocupações básicas.

Nesta segunda, vários cotidianos apresentaram, mais uma vez, os planos de governo de Dilma e Serra, frente a frente, para uma última comparação. Reli com cuidado. Claro, há diferenças quanto às prioridades e aos meios e, de qualquer forma, resta se perguntar qual dos dois seria mais eficiente na hora do vamos ver, mas o sentimento inspirador é parecido. Ou seja, nada impediria que José Serra e Dilma estivessem aqui, na Pavelka, discutindo o que seria melhor para o país, entre amigos.

Afinal, eles pertencem a uma mesma geração, a dos que definiram suas aspirações políticas (de fato, suas vidas) na resistência à ditadura militar. Como não compartilhariam um fundo moral comum? Como poderia ser que ambos não desejassem, de um jeito ou de outro, uma sociedade livre e decente, na qual seja mais agradável conviver?

Quem assistiu aos debates presidenciais na televisão afirma que eles foram chatos; aliás, que toda a campanha foi chata. Concordo, mas não estranho: quando existe, entre candidatos, um fundo político comum, só resta debater temas cuja relevância é fictícia ou pretextuosa e, sobretudo, inventar jeitos de demonizar o adversário.

Essa última foi a função das militâncias, oficiais e oficiosas. Sobre esse tema sou suspeito: tenho ojeriza a todas as identidades coletivas. A história de minha geração de europeus e norte-americanos é que passamos por várias identidades coletivas e, no fim, ficamos fundamentalmente anarquistas (ou, numa vertente mais integrada, individualistas).

Peço vênia, mas, recebendo os inúmeros e-mails das militâncias, com desnudamentos extraordinários de última hora, revelações desvendando o grande complô da mídia, e, enfim, agora, com as maldições dos que perderam e os hosanas dos que ganharam, sinto-me um pouco como num jogo de futebol, em que a violência estúpida e cega das torcidas me impede de aproveitar meu domingo no estádio.

 Mesmo assim, nesta segunda chuvosa, aqui no Rio de Janeiro, o país me parece infinitamente mais maduro do que suas militâncias - mais parecido com uma mesa da Pavelka com amigos discordando e discutindo do que com o espaço raivoso e vazio da gritaria on-line das últimas semanas.

Da Folha de São Paulo.