sábado, outubro 27, 2007
Juarez no domingo às 20 hs no "Conexão"
Eu gosto especialmente dos quadros 'nonsense' dele.
Ontem vi a segunda parte da entrevista com "Conexão Roberto D'Ávila" com Juarez Machado. Será reprisado no domingo(às 20h pela TVE Brasil), vejam no link. Há anos não vejo o Juarez, vendo-o falar, com tanto charme e inteligência, entendi porque eu era encantada por ele. Nos conhecemos quando eu tinha uns 15 anos, sei que se não o conhecesse talvez nunca tivesse desenhado. Tenho influência dele nos desenhos- as figuras não têm pupilas, como as dele. O traço contínuo também é marca de Ju.
Ele é muito divertido.
Contou ontem que o diretor do filme "Le fabuleux destin d'Amélie Poulain"', Jean-Pierre Jeunet, é seu vizinho em Montmartre e é fascinado pelas cores da palheta dele- vermelho e verde, principalmente. Pediu permissão para usar estas cores no filme, que é todo nestes tons- os tons da palheta do Ju. Disse que a Amélie(personagem principal) não tem os olhos como os nossos, falta o branco, que o diretor fez de propósito, para lembrar as figuras de Juarez. Legal, né?
Eu conheci Juarez em Curitiba, no meio de uma praça onde havia o meu colégio, eu já contei antes aqui esta historinha. Fiquei encantada pelos lindos olhinhos azuis dele. Depois fui morar no Rio e ele também estava ali, o procurei no atelier do Sérgio Rodrigues, em cima da Oca, na praça Gal Osório e nos víamos de vez em quando- eu ia vê-lo pintar. Depois ele foi para a rua Maria Angélica, naquela época fazia análise com Katarina Kemper, me indicou um analista, disse:
"Você vai se apaixonar de cara, ele é lindo." Acertou, o homem era muito lindo, Eduardo Requião, foi um dos homens mais belos que eu vi. Hoje está gordo, mas ainda assim é bonito- é irmão do Roberto, do Paraná. A vida é engraçada... Fiz análise 5 anos com Eduardo.
Juarez casou com uma fazendeira rica no Rio, foi morar em Paris, mas está sempre no Rio, eu o encontrava na rua de vez em quando, da última vez me perguntou quando irei visitá-lo em Paris. Respondi: "Um dia". E vou mesmo. Na época vivia preocupada com os filhos, como o pai é ausente eu tenho que ser pai e mãe, não é fácil. Ainda não é fácil. Um dia será? Acho que sim. O mais velho é super tranqüilo, mas o dan ainda me dá trabalho- é absolutamente indisciplinado em tudo- inteligente demais, curioso demais- aí se perde.
Mas voltando ao Juarez, a entrevista dele é muito boa, quem não o conhece veja e fique conhecendo- conta muitas historinhas ótimas, tem até uma teoria do porquê dos pintores brasileiros não serem valorizados fora daqui: acredita que como fomos colonizados por portugueses, que sabiam navegar, mas não pintar, os pintores de língua espanhola- aqui da América são mais valorizados na Europa- por estarem inseridos na cultura hispânica. Acho que faz sentido. A gente sabe o quanto eles- pintores, artistas- sofrem por um reconhecimento lá fora- pouquíssimos têm. E um Botero, que é colombiano, faz sucesso- eu não gosto dos quadros dele.
Não dá pra repetir o que ele conta, é muito bom, fazia tempo não via uma entrevista tão boa, vejam o programa.
*
Horário alternativo: aos domingos às 20h pela TVE Brasil.
sexta-feira, outubro 26, 2007
Juarez Machado no "Conexão Roberto D'Ávila"
Juarez era assim quando o conheci. Ele é o loirinho em pé, era uma graça.
Foto daqui.
Hoje, dia 26, tem "Conexão Roberto D'Ávila" com a segunda parte da entrevista com Juarez Machado. Vai ser reprisado no domingo, vejam no link. Está uma delícia o programa, Ju está super à vontade, eles são amigos, conta muitas historinhas. Muitas eu já conhecia, eu o conheço desde adolescente.
Aqui uma historinha que ele conta no site também:
Abbesses St. Workshop
Edifício construído em 1896, projetado pelo arquiteto Besnard, especialmente para a função de atelier de artista. Situado nas colinas de Montmartre, na rue des Abbesses, onde ilustres moradores viveram, como Theo e o seu irmão Van Gogh. Toulouse Lautrec, Picasso, Modigliani, Van Dogen, Max Jacob e tantos outros que também nesta região viveram, deram ao quartier, a fama e o prestígio da "Cidade Luz", onde as pedras falam de arte.
Após incessante procura de um verdadeiro "atelier d'artiste" em 1991 o encontrei, e consegui adquiri-lo. A partir do pós-guerra estes atelieres, que são um símbolo de um tempo em Paris, tornaram-se cada vez mais raros no mercado imobiliário, pois deixaram a sua função original e passaram a ser a habitação de pessoas que buscavam um lugar especial para viver. Com alta janelas voltadas para a fachada norte onde a luz é ideal, por ser constante, grandes espaços com volumes de seis metros de pé direito se intercalam por mezzaninos.
No 2º e 3ª andar onde trabalho, tenho os meus cavaletes, tintas, livros telas e um rádio que jamais é desligado, mesmo quando saio.Muitas pessoas acendem velas ou incenso, eu uso a música para purificar. Lá pintei tantos quadros, para tantas exposições, entre eles a coleção
Copacabana, inspirado na poesia e na música de seus anos dourados, especialmente para as comemorações de seu Centenário em 1992. Esta exposição foi mostrada nas principais capitais brasileiras e ainda em Paris, Nova York e Miami. Moro nos 4º, 5º e 6º andares do edifício. No último andar, por isso não jogo pedra no telhado do vizinho, o teto é de vidro. De lá se vêem os telhados da velha Montmartre, com sol, chuva ou neve, é sempre um prazer se olhar.
Da janela grito ao Mr. Frédéric, do restaurante em frente "La Mascotte" que me traga as ostras, "Fine Claire nº3", que o champagne já está no gelo. Lá embaixo a rua é viva e musical. Com som próprio, orquestrada com os gritos dos comerciante anunciando suas ofertas, a conversa animada nos bistrôs, o choro de acordeons e a melodia dos "chansonniers". Por entre bancas de frutas, legumes, queijos, flores e peixes seus moradores circulam com a baguete debaixo do braço e na sacola o bom vinho.
Numa esquina, algum pintor com seu cavalete registra o "Village Lepic-Abbesses" para qualquer dia ser visto em algum museuo, o retrato da continuação deste tempo, que é assim há cem anos, pois muitas vezes olho no calendário para ter certeza do ano em que estou.
Quando compro o sagrado pão nosso de cada dia, a jovem padeira, gentil me cumprimenta: "bonjour monsieur le peintre", como certamente fazia sua avó para algum pintor do bairro na sua época. Feliz, sinto que juntos estamos apenas cumprindo a bela tarefa de dar continuidade à história da vida.
quinta-feira, outubro 25, 2007
Hoje é dia de Contardo
"Infiel"
A tolerância não impede de reconhecer e recusar a diferença quando ela é inimiga de nossos valores
A COMPANHIA das Letras acaba de publicar a autobiografia de Ayaan Hirsi Ali, "Infiel - A História de Uma Mulher que Desafiou o Islã".
Hirsi Ali nasceu na Somália (país muçulmano) em 1969, viveu o horror da guerra civil e da luta entre clãs que levaram o país da pobreza à miséria, passou partes da infância e da adolescência na Arábia Saudita e no Quênia e, enfim, adulta, fugiu para o Ocidente. Na Holanda, ela se tornou cidadã e, logo depois, foi eleita deputada. Pela sua história e pela coragem de suas palavras, ela continua sendo alvo de um fanatismo assassino.
O livro, além de tocante, é imprescindível para quem queira, hoje, perguntar: "Vigia, como está a noite?".
As primeiras 300 páginas tratam da progressiva metamorfose de Ali: uma menina definida pela sua ascendência e pela obediência aos homens e ao Alcorão se transforma numa jovem pessoa atormentada por dúvidas sobre sua fé e pela vontade de escutar seus sentimentos e de escolher livremente seus objetos de amor.
Essas páginas deveriam estar nas bibliografias de introdução à antropologia cultural: elas explicam perfeitamente quem somos nós, ocidentais. Na história da jovem somali, a oposição à autoridade tradicional do clã e do texto sagrado não está nos grandes textos do Ocidente -está nos romances.
Fragilidade e grandeza de nossa cultura: a liberdade do indivíduo moderno é, antes de mais nada, liberdade de amar e de romancear o amor. "Romeu e Julieta" e Barbara Cartland nos definem melhor do que "O Contrato Social".
Li as últimas 200 páginas do livro na noite de sábado, sem parar, madrugada adentro. Nelas, Ali, ao contar as peripécias de sua vida na Holanda, expõe sua crítica do Islã.
Depois de 11 de setembro de 2001, talvez você tenha lido "Choque de Civilizações?", de Samuel Huntington, e, como eu, tenha resistido à idéia de que o terceiro milênio seja destinado a encenar um conflito cultural sangrento entre o Ocidente e o Islã. Talvez você, como eu, sem examinar de perto os textos e os fatos, tenha se juntado ao coro da tolerância e à visão otimista do Islã paz-e-amor, convencido de que aceitar a diferença seja (como é, de fato) uma prerrogativa crucial e gloriosa de nossa cultura.
Só a tolerância -você pode ter pensado, como eu- permitirá a integração que confirmará a humanidade comum de todos, realizando o sonho ocidental moderno. Pois bem, Ali pensa diferente.
Para ela, o fundamentalismo e o terrorismo islâmicos de hoje não se fundam numa distorção do Islã, eles estão inscritos na letra do Alcorão e do Hadith.
Só será possível evitar um embate frontal se o mundo islâmico passar por uma revolução interna comparável com a que sacudiu o cristianismo no começo da modernidade, quando o indivíduo (com sua liberdade e seu foro íntimo) se tornou um valor bem mais importante do que a instituição e o texto religiosos.
Portanto, para Ali, sobretudo nos lugares de maior fricção entre o Islã e o Ocidente, como na Europa, a estratégia de uma convivência possível não passa pela simples tolerância, mas pela exigência ativa de uma integração dos imigrantes na cultura para onde se mudaram ou fugiram. Essa exigência inclui a capacidade de recusar a diferença quando ela for inimiga de nossos valores.
Não há espaço, no Ocidente, para a submissão das mulheres, o ostracismo das minorias sexuais, o poder patriarcal indiscriminado e, sobretudo, não há espaço para a confusão entre religião e Estado de direito.
Theo Van Gogh, holandês, dirigiu um documentário, escrito por Ali, sobre a submissão da mulher no Islã. Ele foi assassinado e degolado por um fundamentalista islâmico, que cravou no peito de sua vítima uma mensagem para Ali, perguntando se ela estava disposta a morrer por suas idéias como ele, o assassino, estava pronto a se sacrificar pelas suas.
É um argumento freqüente nos comunicados exaltados dos terroristas: o Ocidente estaria fadado a desaparecer porque preza a vida do indivíduo.
Ora, Van Gogh, diante de seu assassino, antes de ser morto, perguntou: "Será que a gente não pode conversar?". O assassino deve ter pensado que se tratava de mais uma demonstração da fraqueza e da covardia ocidentais. Ele se enganou. Era a maior demonstração de fé nos valores do Ocidente e, portanto, de força.
PS: Mais aqui
sobre a autora.
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